CAPÍTULO QUATRO

 

Como Lidar Com O Destino

 

O "Bhagavad-Gita" é muito informativo quanto à forma como se deve enfrentar o próprio destino. Quando confrontado pela possibilidade de participar de uma guerra fratricida, a fim de recobrar seu reino injustamente roubado, Arjuna comentou com Sri Krishna:

 

aho bata mahat papam kartum vyavasita vayam

yad rajya-sukha-lobena hantum sva janam udyatah

yadi mam apratikaram asastram sasta-panayah

dhartarastra rane hanyus tan me kshemataram bhavet

 

"Ai de mim, como é estranho que estejamos nos preparando para cometer atos tão pecaminosos! Levados pelo desejo de gozar da felicidade real, estamos para matar nossos primos. Seria melhor para mim se os filhos de Dhritarastra, de armas em punho, me matassem desarmado e indefeso no campo de batalha!" ("Bhagavad Gita", capitulo 1, textos 44 e 45).

 

Noutras palavras, Arjuna não estava inclinado a participar da guerra para fins materiais porque era santo e fazia as considerações mais elevadas. No segundo capítulo, texto 5, Arjuna diz: "Shreyo Bhoktum Bhaiksyam". Isto é: "Seria melhor mendigar para viver (do que matar)". Arjuna daria com prazer um grande reino, para evitar o derramamento de sangue, e cairia fora da guerra, tornando-se um mendigo. No texto 9, ele chega ao ponto de afirmar: "Govinda, eu não vou lutar".

 

A reação de Sri Krishna foi muito interessante. Ele não advertiu Arjuna para se afastar dos problemas da vida. Em vez disso, Ele fez com que Arjuna tivesse uma perspectiva espiritual dos fatos, que considerasse a devoção a Deus da mesma forma que considerava o dever e o carma. E ao final do "Bhagavad-Gita", Sri Krishna deixa tudo muito claro:

 

shreyan sva dharmo vigunah

para-dharmat sv-anushthitat

svabhava-niyatam karma

kurvan napnoti kilbisham

 

"É melhor se dedicar ao próprio trabalho, mesmo que imperfeitamente, do que aceitar a ocupação alheia e praticá-la imperfeitamente. Os deveres prescritos de acordo com as naturezas das pessoas nunca são afetados por reações pecaminosas" (capitulo 18, texto 47).

 

A reação de Arjuna, ao receber a mensagem completa do "Gita", foi talvez ainda mais interessante. Ele não pediu favores pessoais ao longo do alívio cármico, muito embora tivesse á sua frente a forma original de Vishnu, no papel de amigo. Ele não pediu que o tempo voltasse para completar coisas do passado, nem tentou escapar do carma que estava á sua frente com anéis, talismãs, cantando mantras ou se cobrindo de poder ou de qualquer outra forma. Não. Em vez disso, Arjuna descobriu dentro de si a disposição para confrontar a situação que se apresentava e lidar com ela.

 

Arjuna uvacha

Nashto mohah smitir labdha

tvat-prasadam mayacyuta

sthito `smi gata-sandehah

karishye vacanam tava

 

"Arjuna disse: Meu caro Krishna, Oh, Ser Infalível, minha ilusão desapareceu. Recobrei minha memória pela Sua misericórdia. Estou firme e livre da duvida, preparado para agir conforme as Suas instruções" ("Bhagavad-Gita", verso 73, capitulo 18).

 

Noutras palavras, Arjuna parecia pronto para "fazer seu próprio trabalho" (enfrentar seu próprio destino), mesmo que este lhe parecesse "imperfeito" sob alguns ângulos. Tão diferente do começo do "Gita", quando aquele conjunto de problemas específicos a sua frente lhe parecia tão terrível que ele tremia, deixando cair o arco no chão, se sentia confuso e com a boca seca. Entretanto, uma vez livre das ilusões, ele então compreendeu as coisas com clareza e se dispunha a aceitar o destino que se lhe apresentava.

 

Hoje em dia, é claro, tornou-se moda tentar remediar as indicações do tempo e da astrologia através de várias medidas. Mas talvez este não seja realmente o nosso propósito. Na vida real, temos de nos dispor a enfrentar as coisas e fazermos nossa parte, até que o carma se extinga. Imagine um jogador cujo time esteja perdendo uma partida de um campeonato, e sem tempo para se recuperar. Será permitido que ele fique se lamentando e saia do jogo? Não. Ele ainda terá de lutar ate o ultimo minuto, mesmo que saiba que vai perder. Ele tem de ser responsável. Tem inclusive de saber como perder, assim como nós temos que saber como enfrentar nossas reações cármicas. A simples atitude de responsabilidade que Arjuna demonstrou acerca do seu destino e certamente uma excelente atitude para ser aplicada a leitura de horóscopos. A atitude de Arjuna nasceu de um estado mental livre de ilusões.

 

Mas as almas em estado condicional não podem reagir ao mesmo nível que Arjuna. Os Vedas e a literatura astrológica clássica mencionam medidas corretivas, que podem ajudar a minimizar as reações cármicas, embora não se prometa a erradicação das mesmas. Então, de certa forma, o destino não e assim tão severo, e a população em geral pode tirar daí suas vantagens.

 

Infelizmente, parece que existem alguns conceitos mal interpretados acerca dos métodos de minimização das indicações planetárias. Eu lhe asseguro que este não é um assunto muito simples. A gemologia, por exemplo, é uma área que também teve muita confusão neste sentido.

 

Num documento chamado "O Uso de Jóias é Genuíno ou Falso?", Shyamasundara Dasa, um astrólogo védico bem conhecido, cita o capítulo 68 do "Garuda Purana", versos 6-8: "Por causa do seu mérito  intrínseco, algumas delas (as jóias) tem o poder de afastar obstáculos causados pela presença de demônios, venenos, serpentes e enfermidades, ao passo que outras não possuem quaisquer qualidades". O texto 11 também faz uma importante declaração: "Primeiro, a forma e a cor tem que ser testadas, e então seus méritos e defeitos devem ser compreendidos; sua influencia pode então ser conhecida..." E a seguir o texto 12 afirma: "As pedras que forem compradas ou usadas pela primeira vez sob um mau ascendente, ou num dia desfavorável, se tornam defeituosas e até perdem seus méritos".

 

Shyamasundara continua, dizendo: "Conforme os versos apresentados, um perito deve conhecer a influência específica de cada jóia. Isso não significa que todos os diamantes tenham um efeito igual, ou que todos os rubis tenham outro, e assim por diante para todas as categorias de pedras preciosas. Segundo o verso 11, parece que cada jóia individual pode ter suas próprias qualidades únicas, que ela pode ou não dividir com outras gemas, da sua classe. Eu ouso afirmar que o tipo de especialista em gemas que pode determinar as qualidades individuais de uma pedra preciosa é, provavelmente, mais raro que as próprias gemas". Ele é bastante claro neste ponto.

 

E apesar do fato de se atribuírem ás pedras, no Purana, influências místicas, elas não são especificamente prescritas para anular as mas influências indicadas no horóscopo. Mesmo que sejam mencionadas na literatura astrológica clássica, é importante compreender em que contexto elas são mencionadas. Sempre, a menção feita a pedras preciosas é simplesmente colocada no meio de um parágrafo que consiste de uma lista de todas as coisas relacionadas com um determinado planeta. Um parágrafo típico poderá mencionar, por exemplo, que tecidos novos, algodão, água, pérolas, sal e leite correspondem à Lua. Mas isso não é uma confirmação de que as pérolas são efetivas contra as indicações planetárias adversas. As pérolas

são apenas citadas como correspondentes ao padrão da Lua. Os astrólogos tântricos (místicos) da Índia fazem um bom negocio com a prescrição de pedras preciosas, mas não existem instruções para que elas sejam prescritas desta forma, na literatura astrológica.

 

Infelizmente, não é raro hoje em dia, tanto no Ocidente como na Índia, que os astrólogos instruam como se "controla o destino" com o use de gemas que eles prescrevem. Eu, pessoalmente, já vi astrólogos darem palestras interessantes deste teor e, então, oferecerem, depois da palestra, pedras para venda. Na Índia, os astrólogos até recebem uma comissão sobre as pedras vendidas que eles tenham prescrito. Aparentemente, eles recomendam certos joalheiros, com os quais fazem seus arranjos comerciais. Obviamente, é difícil para qualquer profissional de aconselhamento ser objetivo, se ele tiver interesses e negócios relacionados ao próprio aconselhamento, e existem muitos casos de astrólogos que vendem pedras preciosas a preços altos, aproveitando-se das almas confiantes.

 

Simplesmente, a astrologia védica não prescreve gemas como remédio contra o mau carma de ninguém. E embora as pedras preciosas exerçam, sim, influências, seus especialistas já não são tão comuns hoje como nos tempos védicos, as gemas são muito caras e muitos dos chamados astrólogos, por motivos que não cabem aqui, confundem o assunto.

 

No capítulo 84 do "Brihat Parashara Hora Shastra", entretanto, o sábio Parashara sugere que se adorem as divindades planetárias e que se ofereçam orações e caridade aos brâmanes (sacerdotes), como medidas corretivas. Ele explica que o criador (Brahma) teria instruído as divindades planetárias para que "fossem benéficas para aqueles que os adorassem", e Parashara não prescrevia gemas. Na Índia, pode-se aproveitar e colher benefícios do navagraha puja (adoração aos nove planetas), nos templos apropriados. No Ocidente, isso é difícil. Também esta ficando difícil encontrar um brâmane que valha uma caridade, nos dias atuais.

 

A seguir, serão apresentados os diferentes mantras planetários e o numero de vezes que os mesmos devem ser cantados. A pessoa deverá começar a cantar o mantra entre a Lua Cheia e a Nova, no dia representado pelo planeta em questão. Por exemplo, o mantra da Lua deveria ser iniciado numa segunda-feira. Os mantras são cantados em cordas com 108 contas de japa, que se parecem muito com os rosários.

 

MANTRA DO SOL - DEVERÁ SER CANTADO 7.000 VEZES

 

Japa Kusuma-sankarsham kashyapeyam maha-dyutim

tamo-rim sarva-papa-ghnam pranato `smi divakaram

 

"Cantemos as glórias do Deus Sol, cuja beleza rivaliza com a de uma flor! Eu me prostro ante Ele, o intensamente brilhante filho de Kashyapa, que é inimigo das trevas e destruidor de todos os pecados."

 

MANTRA DA LUA - DEVERÁ SER CANTADO 11.000 VEZES

 

Dahhi-shankha-tusharabham kshirodarnava-sambhavam

namami shashinam soman sambhor mukta-bhushanam

 

"Ofereço minha obediência ao Deus da Lua, claro como queijo branco, conchas do mar e a neve. Ele é a divindade que governa o néctar soma-rasa, nascido do oceano de leite, e quem enfeita o alto da cabeça do Senhor Shambhu."

 

MANTRA DE MARTE - DEVERA SER CANTADO 10.000 VEZES

 

Dharani-garbha-sambhutam vidyut kanti-samaprabha

Kumaram shakti-hastam ca mangalam pranamamy aham

 

"Ofereço minha obediência ao Sri Mangalam, o Deus do planeta Marte, que nasceu do ventre da deusa da Terra. Seu brilho é como o de um relâmpago, e Ele parece um jovem carregando uma lança nas mãos."

 

MANTRA DE MERCÚRIO - DEVERÁ SER CANTADO 4.000 VEZES

 

Priyangava-gulikashyam rupena pratimambudam

saumyam saumya-gunopetam tani pranamamy aham

 

"Prostro-me aos pés de Buddha, Deus do planeta Mercúrio, cuja face é como um globo perfumado pela erva priyangu e cuja beleza se iguala à de uma flor de lotus. Ele é muito gentil e possui todas as qualidades que atraem."

 

MANTRA DE JÚPITER - DEVERÁ SER CANTADO 19.000 VEZES

 

Devanam ca rishinam gurun kanchana-sannibhham

buddhi-bhutam tri-lokesham tam namami brihaspatim

 

"Prostro-me aos pés de Brihaspati, Deus do planeta Júpiter. Ele é o mestre espiritual de todos os semideuses e sábios. Dourado, ele é cheio de inteligência e o Senhor controlador dos três mundos."

 

MANTRA DE VÊNUS - DEVERÁ SER CANTADO 16.000 VEZES

 

Hima-kunda-mrinalabham daityanam paramam gurum

sarva-shastra-pravaktaram bhargavam pranamamy aham

 

"Ofereço minha obediência ao descendente do Sábio Brighu (Venus), que é branco como um lago coberto de gelo. Ele é o mestre espiritual supremo dos inimigos demoníacos dos semideuses, aos quais Ele revelou todas as escrituras."

 

MANTRA DE SATURNO – DEVERÁ SER CANTADO 23.000 VEZES

 

Nilanjana-samabhasam ravi-putram yamagrajam

Chaya-martanda-sambhutam tam namami shaishcharam

 

"Prostro-me aos pés do lento Senhor Saturn, que é azul-escuro como óleo de nilanjana. Irmão mais velho do Senhor Yamaraj, ele nasceu do deus Sol e de sua esposa Chaya (sombra)."

 

MANTRA DE RAHU - DEVERá SER CANTADO 18.000 VEZES

 

Ardha-kayam mahim-viryam chandraditya-vimardanam

simhika-garbha-sambhutam tam rahum pranamamy aham

 

"Ofereço minha obediência ao Senhor Rahu, nascido do ventre de Simhika, que tem apenas metade do corpo mas que possui tal poder que é capaz de vencer o Sol e a Lua."

 

MANTRA DE KETU - DEVERÁ SER CANTADO 17.000 VEZES

 

Palasa-puspa-sankasam taraka-graha-mastakam

raudram raudratmakam ghoram tam ketum pranamamy aham

 

"Ofererço minha obediência ao violento e temido Senhor Ketu, que tem a potencia do Senhor Shiva. Da cor da flor da planta palasa, Ele é a cabeça das estrelas e dos planetas."

 

O canto do Vishnu Sahasra Nama, ou os mil nomes de Vishnu, também é prescrito como um remédio. Na atual era de Kali, porem, recomenda-se uma forma mais abreviada dos mil nomes de Vishnu. (A literatura Védica divide o tempo em ciclos de quatro eras cada, a atual sendo a de Kali: briga e hipocrisia.) No "Brihat Naradiya Purana", existe um texto no qual se lê:

 

Harer Nama, Harer Nama, Harer Nama eva kevalam

Kalau nastyeva, nastyeva, nastyeva, gatir anyata

 

"Cante Hare Krishna, cante Hare Krishna, cante Hare Krishna, e a única maneira, a única maneira, a única maneira de se chegar à auto-realização na era de Kali."

 

Quando o leitor chega a este ponto, ele minimiza ao máximo as indicações astrológicas adversas. Além disso, ele atinge o ápice da astrologia védica e, na verdade, o ápice da literatura védica também. No capitulo 15 do "Bhagavad-Gita", Sri Krishna afirma que "Vedaish ca sarvair aham eva vedyo". (Por todos os Vedas é que Eu serei conhecido.)

 

Bem no inicio do "Hora Shastra" de Parashara, o sábio explica que as diferentes divindades planetárias não são mais que expansões diretas de Vishnu. Talvez seja a isso que Sri Krishna se referia no capitulo 9, texto 23 do "Bhagavad-Gita", onde Ele explica:

 

ye `py anya-devata-bhakta

yajante sharaddhayanvitah

te pi mam eva kaunteya

yajanty avidhi-purvakam

 

"Aqueles que são devotos de outros deuses e que os adoram com fé, na verdade, adoram apenas a Mim, Oh, filho de Kunti, mas eles não sabem que agem errado."

 

Logo, se quisermos adotar a oração como remédio, ao invés de orar para as divindades planetárias, por que não rezar para Vishnu ou ao próprio Krishna, o "Adi Purusha" (Brahma Samhita), a pessoa original? Esta mesma idéia aparece noutras partes da literatura védica. Por exemplo, no canto nove do "Bhagavat Purana", na narração na qual Sri Krishna levanta o Monte Govardham. Naquela época, Sri Krishna explicou ao seu pai terreno que, em vez de adorar o semideus Indra, ele poderia usar a mesma parafernália para adorá-lo diretamente.

 

Eis aqui uma outra confirmação do capitulo dois, texto 51 do "Bhagavad-Gita":

 

karma jam buddhi-yukta hi

phalam tyaktva manishina

janma-bandha-vinirmukta

padam gaccanty anamayam

 

"Prestando, assim, serviço devocional ao Senhor, os grandes sábios e devotos se libertam dos resultados do carma no mundo material. Desta forma, eles ficam livres do ciclo de nascimento e morte e atingem o estado alem de todas as misérias."

 

Não existe nada escrito que afirme que os semideuses ou as divindades planetárias sejam capazes de aliviar as reações cármicas neste nível. E, para dizer a verdade, este nível de liberação cármica normalmente envolve mais que a atual encarnação, que e a que geralmente se julga a partir do horóscopo. Já vimos a declaração do "Vedantra Sutra", no capitulo intitulado "Determinismo Astrológico", onde está dito que, mesmo que se atinja a auto-realização completa, os carmas pravritta devem seguir o seu curso. (Os carmas pravritta são os que trazemos conosco ao nascer, os que estão no horóscopo. É como se eles estivessem obrigados a acontecer, ou que já tenham ate ocorrido, sendo apenas uma questão de tempo para que eles se manifestem.)

 

Parece óbvio que a oração e a adoração são remédios convincentes em relação às outras afirmações contidas na literatura védica, assim como diretamente indicado pelo sábio Parashara. É preciso adaptar as coisas da melhor forma para se usar jóias adequadamente. Mas se a intenção é conseguir alguma minimização de carma, isto deverá ser obtido através da oração e não pela compra de jóias. Parece que nossa melhor escolha e enfrentar nossas reações cármicas com a atitude responsável que Arjuna demonstra ao final do "Gita", sem procurar uma saída fácil nem tentar fugir, como foi o primeiro impulso de Arjuna.

 

 

Use o seu Browser para voltar ao índice